A viagem segue tranquila no percurso Mutundo-Arco-Íris, passando pelo centro da cidade do Lubango, capital da província da Huíla. De repente um passageiro, sentado na cadeira intermédia do candongueiro “azul e branco”, começa, literalmente, a revistar-se.
Pega nos bolsos da calça. Apalpa os da frente e os de trás. De seguida abre a pasta preta que levava ao colo. Agitado, revista os bolsos laterais e depois os principais. Vasculha os documentos. Verifica, também, outros haveres na bolsa e…nada.
Leva as mãos à cabeça. A preocupação é tanta que chama a atenção dos outros passageiros, que perguntam o que se estava a passar. A resposta sai como um foguete, mas dirigida para quem está alheio ao assunto.
Solta um palavrão: “…epa motorista, pára, pára, pára já aqui mesmo!”, suplica, sem deixar o condutor saber o que se passa. “Meu Deus!
Esqueci o meu telemóvel em casa!”, acrescenta, já de pé a tentar descer do táxi ainda em movimento.
O motorista pede calma. Arranja espaço adequado. Estaciona depois da ponte do rio Nambambe. O homem desce apressado. Tenta contornar o veículo para atravessar a estrada. O gerente avisa que é conveniente pagar. Da boca do indivíduo, sai mais um palavrão antes de tirar o dinheiro do bolso e pagar a corrida.
“Preciso de ir buscar o telefone. Ficou em cima da mesa, em casa. Tenho de voltar à Centralidade da Quilemba”, desabafa. O momento, aparentemente, engraçado deixou pasmos alguns e intrigados outros passageiros que assistem o passageiro a atravessar, às pressas, a rua para pegar mais um táxi. São 7h45 da manhã.
Enquanto os companheiros escarnecem a atitude do cidadão, outros passageiros desvalorizam tanta agitação por causa de um telemóvel que ficou por esquecimento por cima da mesa em casa.
Cada um emite a sua opinião sobre a atitude do homem. Ninguém se contém ao ver alguém, na casa dos 40 anos, voltar cerca de 15 quilómetros para ir buscar o telemóvel que, por sinal, tinha ficado seguro em casa. “Isso está mal. Correr assim por causa do telefone? Assim prefere chegar atrasado ao serviço. Mba upangue (é trabalho)!? Hum!”, exclama uma mais velha, num misto de português e umbundo.
“Assim vai atrasar mesmo por causa das mensagens das novinhas. Está a correr para a esposa não ver…”, sentencia outra passageira com um bebé ao colo.
“Deve ser por causa de assuntos importantes”, defendeu outro passageiro, retirando a malícia dos primeiros passageiros.
A cena virou motivo de debate ao longo da viagem, com o motorista e o cobrador a moderarem o tema. No entanto, poucos fizeram uma introspecção para responder à pergunta que pairava no ar: Você consegue viver sem o telemóvel?
A nossa reportagem foi atrás de respostas a esta questão e traz os argumentos de razão de alguns interlocuto-res sobre a importância, o impacto e as consequências do uso do telemóvel na vida social e profissional.
Razões divergentes
A mesma pergunta foi dirigida ao director do Centro de Artes do Lubango. A resposta demorou a sair. Foi antecedida de um grande suspiro. “Uff…acho que não”, respondeu Nelson Dongala, considerando ser “muito difícil, actualmente, isso acontecer”.
Nesta era da globalização digital, sustenta, o telemóvel é uma ferramenta indispensável para a promoção da sua imagem e dos artistas.
Nelson Dongala afirma que a visibilidade do trabalho artístico depende do uso do telemóvel para divulgar e interagir nas redes sociais.
“Normalmente, estou grudado ao telemóvel a conversar e interagir com amigos, parceiros, seguidores e gerir as publicações”, afirma. Ao avaliar a importância do dispositivo, sublinha a utilidade do telemóvel no dia-a-dia, mas lembra que se “as pessoas o não usarem com racionalidade, atrapalha”.
“O telemóvel é um aparelho que precisa de ser usado com parcimónia. Não como temos visto muita gente a usar esta tecnologia para prejudicar a si mesmo e aos outros”, afirma.
O contabilista Isalino Nguimba da Cruz Augusto também respondeu à pergunta. Com algumas reticências, o também escritor, conhecido nas lides literárias como Nguimba Ngola, afirmou que é quase impossível hoje alguém viver sem o telemóvel, por ser um aparelho utilitário e facilitador de comunicação interpessoal.
“Comunico muito com os meus clientes. Hoje por hoje temos quase tudo no telemóvel. Este aparelho chega a ser o meu escritório. Sem ele, já me sinto mal”, admite. O poeta lembra que sofreu, este ano, quando tentou viver uma experiência sem o telemóvel.
“Em Agosto, perdi o telemóvel por descuido. Foi uma experiência dolorosa. Não vivo sem telemóvel no meu dia-a-dia”, afirma. O também membro da União dos Escritores Angolanos (UEA) sublinhou que foi preciso reeducar-se para saber lidar com este dispositivo.
Márcia dos Reis, estudante do curso de Informática e Gestão, afirma também que não consegue viver sem o telemóvel, por ser um indispensável meio de comunicação. Ela explica que quando usa o telemóvel está sempre conectada à Internet a assistir vídeos, ouvir música e a investigar matérias. “Ninguém, em sã consciência, consegue passar sem o telemóvel”, reforça.
Sinais de alerta
Prestes a entrar no carro, dá a falta de algo. Procura como quem perdeu algum tesouro no carro. Volta para o escritório. Verifica sobre e por baixo da secretária. Vê tudo. Nas gavetas até por cima da mesa do livro de ponto. Resmunga por não encontrar o que procura.
Uma colega dá conta da preocupação e pergunta o que se passa. Responde que procura pelo telemóvel, pois “não sabia onde o tinha deixado”. A colega ri-se e avisa que o telemóvel estava na sua mão junto com as chaves.
Envergonhado, agradece e sai enquanto abana a cabeça.
Esta situação, ocorrida com um funcionário, acontece com muita gente.
Talvez pela agitação diária. Já aconteceu também com o director do Centro de Artes, Nelson Dongala. “Algumas vezes já procurei pelo telemóvel noutros lugares, mas estava mesmo na minha mão. Só para ter uma ideia onde o telemóvel nos leva. A ânsia é tanta de tê-lo que se perde entre os nossos dedos”, ironiza.
Nelson Dongala refere que tem estado atento às consequências do uso excessivo do telemóvel. Afirma que lê matérias relacionadas com os perigos do uso exacerbado dos aparelhos electrónicos, por isso aconselha à moderação.
“A dependência tecnológica é muito perigosa. Televisão, telemóvel e vídeo-jogos e outros, que ocupam o maior tempo das nossas vidas, são perigosos. As pessoas devem ter muita cautela, porque já se fala de doenças tecnológicas”, alerta.
“Devemos sim usar o smartphone e outras tecnologias tão úteis actualmente no dia-a-dia. Mas devemos também ter o auto-controlo e disciplina para que não seja uma arma letal nas nossas mãos. Saiba usar”, aconselha.
Nguimba Ngola já suspeitou de caminhar para o vício porque estava sempre apegado ao telemóvel, conectado às redes sociais. “Esta conexão consome tempo. Se não conseguir concentrar-se e ficar sempre ao telemóvel, deve desconfiar. Porque não é normal faltar a um compromisso por causa disso”, argumenta.
Para o escritor, o truque para cumprir as tarefas sem distracção é desconectar-se totalmente da Internet, porque entende que o telemóvel em si “não é tão perigoso, mas as redes sociais são”, porque estrangulam objectivos pessoais e profissionais.
“Para manter a concentração na actividade é melhor se desconectar da Internet. Livrar-se deste mundo virtual ou deixar o telemóvel distante. Acredito que um viciado dificilmente fica 20 minutos sem mexer no telemóvel”, acredita.
Nguimba Ngola admite que o uso constante do telemóvel mostra que a interferência da tecnologia na vida humana é prejudicial, apesar de todas as vantagens inerentes à comunicação e interconexão social.
Márcia dos Reis reconhece que o telemóvel e outros materiais electrónicos são úteis, mas distraem muito, chegando ao ponto de destruir a relação com as pessoas. “Muito uso torna a pessoa anti-social e alguns ficam agressivos. Tudo por excesso faz mal. Vamos optar por outros hobbies”,
Regressar a meio do caminho
Nelson Dongala regressou a casa porque pelo caminho percebeu ter esquecido o telemóvel. O director do Centro de Artes justifica esta manobra repentina com a importância que o smartphone ocupa na sua vida.
“Muitas vezes, precisou contactar com alguém talvez para comunicar algo importante. Eu já voltei inúmeras vezes a correr literalmente para buscar o telemóvel deixado ficar em casa por esquecimento”, conta sorridente, ironizando que “não é por outra razão, pois vivo sozinho”.
Nguimba Ngola ri ao ouvir a pergunta sobre o regressar a casa a meio do caminho por causa do telemóvel. O escritor admite, também, que já regressou muitas vezes a casa para apanhar o telemóvel, de Cacuaco ao Sequele, em Luanda, numa distância de cerca de 30 quilómetros.
O secretário para as Actividades Culturais da União dos Escritores Angolanos justifica que era necessário pegar o telemóvel para participar numa reunião via Zoom. Mais à frente admite que muita gente regressa por motivos passionais, para evitar mal-entendidos por causa de mensagens trocadas nas redes sociais.
“Talvez seja melhor regressar para pegar o telemóvel e evitar situações indesejadas. Sei que a minha companheira não mexe no meu telemóvel. Mas a curiosidade humana, por vezes, leva a querer saber sobre a actividade alheia. Então é melhor levar o telemóvel”, aconselha, sorridente.
Consulta a um psicólogo
O psicólogo Alberto Nelumba, que antes respondeu à pergunta que dá título a esta matéria, alerta para as consequências psíquicas por uso excessivo do telemóvel. “Conseguiria viver sem telemóvel, se estivesse inserido num meio onde não houvesse a possibilidade de me comunicar e resolver tarefas diárias de forma remota”, iniciou.
Diz que a sociedade está em rede, na era da informação ou da globalização. “Se não tivesse telemóvel, eu não poderia ajudar o caro jornalista a responder às perguntas para complementar esta reportagem, por exemplo”, argumenta.
O especialista informa que entre as consequências psicológicas do uso exagerado do telemóvel, o destaque vai para a ansiedade, dificuldade de relacionamento na vida real, possibilidade de desenvolver dependência, insónia e falta de concentração.
Esclarece que o uso descontrolado do telemóvel pode provocar outros efeitos psicológicos negativos, como a ansiedade patológica, depressão e, nalguns casos, transtorno obsessivo compulsivo.
Alberto Nelumba disse que, em Psicologia, a dependência por aparelhos electrónicos é conhecida por homofobia. Uma pessoa com este quadro, refere, apresenta sintomas parecidos aos de um toxicodependente. “Preocupação, desconforto, aceleração nos batimentos cardíacos e outros sintomas fisiológicos”.
O psicólogo aconselha os usuários de telemóvel ou de outros dispositivos electrónicos para a gestão do tempo e definição de prioridades. O primeiro conselho do doutor Alberto Nelumba é definir tarefas que “não podem ser feitas simultaneamente com o uso do telemóvel” e “estabelecer um limite máximo de uso diário de telemóvel, conforme orientado por especialistas”.
O especialista refere que esse tempo pode ser monitorado através de uma ferramenta existente nas definições dos próprios telemóveis. Outra dica do psicólogo é usar outras ferramentas que o telemóvel traz, como o modo avião, “não incomodar”, entre outras para limitar notificações.
Abstinência tecnológica
Todos reconhecem a utilidade do telemóvel na vida profissional e familiar, sempre que for usado com racionalidade e sabedoria. As distracções constantes durante as tarefas profissionais levam o director do Centro de Artes a seguir conselhos de especialistas em foco e autocontrolo.
Nelson Dongala opta por algum jejum, que chama de forma humorada de abstinência tecnológica. “Fico dois a sete dias sem telemóvel para me autodisciplinar”, afirma o artista, que justifica o radicalismo para evitar o vício. Nelson Dongala faz tudo para rever a maneira de lidar com o smartphone e evitar complicações na vida profissional e na saúde mental.
“Se calhar já estava a caminho do vício. Porque se eu não tomar as devidas precauções acredito que posso cair mesmo no vício. O telemóvel, infelizmente, tem ocupado o maior espaço do nosso tempo. Devemos rever isso. Por isso, faço jejum e para mim funciona, sobretudo quando pretendo realizar tarefas que exigem maior atenção e concentração”, garante.
“A abstinência tecnológica tem resultado. Quando estou focado num trabalho fico mesmo de jejum. Em vários momentos somos, no entanto, obrigados a usar o telemóvel, mas o compromisso pessoal e com terceiros nos deve manter distantes dos dispositivos e sobretudo das redes sociais”,
acrescenta. Nguimba Ngola diz que, também, faz jejum. Acredita que ajuda muito, porque se afasta excessivamente de informações fúteis que mais atrapalham do que agregam valor.
A estudante Márcia dos Reis decidiu trocar por algum tempo o smartphone por um dispositivo analógico, porque percebeu que estava a perder o norte. “O dia tem 24 horas. Eu fico praticamente 19 horas conectada ao telemóvel”.
Márcia dos Reis sabe que o uso constante do telemóvel prejudica a saúde mental e física, sobretudo a visão, além de ocupar muito tempo.
Ela afirma que o smartphone é a primeira coisa a pegar e a última a deixar antes de adormecer.
Reconhece as vantagens do telemóvel e lembra as consequências. “O tempo gasto poderia servir para realizar outras coisas melhores e úteis para a vida”, reconhece, referindo que usa óculos graduados por causa dos dispositivos electrónicos.
Ela fechou a conta na rede social Facebook para evitar o pior. “Eu ficava muito isolado do convívio social. Preferia estar na Internet a interagir com a família por causa do telefone e do computador. Tive que fechar. Muita coisa melhorou, sobretudo na minha vida familiar e académica”, admitiu.
Fonte: Jornal de Angola
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